Crítica de filme - O TIGRE E O DRAGÃO
O Tigre e o Dragão (Crouching Tiger, Hidden Dragon)
Tailândia/China/Estados
Unidos, 2000. Direção: Ang Lee. Com Chow Yun-Fat, Michelle Yeoh e
Zhang Ziyi. 120 min. Guerreiro
pede a amiga que leve sua lendária espada. Quando chega ao destino, a espada é
roubada.
Cotação: êêê (ótimo)
Uma
lendária espada chamada “Destino Verde”, pertencente a legendário guerreiro
agora em crise existencial; sua companheira de lutas de longa data; uma rebelde
princesa adolescente; e Raposa Jade, guerreira famosa por cometer atos
desonrosos. Todos eles são personagens de uma bela história passada numa remota
China.
Tudo começa
quando o mestre wudan Li Mu Bai (Chow Yun-Fat), em crise existencial, decide
encerrar uma fase sangrenta de sua vida e começar uma outra, e, simbolizando
isso, presenteia um velho amigo, o Senhor Te, com sua lendária espada “Destino
Verde”. Para tanto, pede à sua amiga Shu Lien (Michelle Yeoh), também grande
guerreira, que faça a entrega da espada. Porém, depois de entregue, a “Destino
Verde” é roubada na mesma época da visita do Governador Yu e sua jovem filha
Jen (Zhang Ziyi) à casa de Te.
Logo o
espectador fica sabendo que Raposa Jade é tutora da princesa Jen e que Li Mu
Bai busca vingar-se dela, uma vez que ela havia assassinado seu mestre.
Daí
iniciam-se as lutas de artes marciais, uma das duas coisas que o filme tem de
melhor. As coreografias incríveis são de Yuen Wo-Ping, de “Matrix” (1999), e
estão acompanhadas por efeitos especiais simples mas competentes. Os
personagens são capazes de fazer coisas surpreendentes, como planar, saltar
direto do chão ao alto de prédios, correr sobre a água, etc. Nesse ponto, “O
Tigre e o Dragão” tem um caráter fantasioso, tratando de pessoas com
habilidades que não existem e na verdade nem poderiam existir. Mas o filme nos
traz uma idéia não de que “não possa existir”, e sim de que “não mais existe”.
Isso se deve ao fato de que dentro de sua história o filme trata de pessoas
reais, com habilidades possíveis para o mundo em que habitam. Os seus
personagens são capazes de fazer o que tudo o que fazem na tela, mas em nenhum
momento são tidos como “super-heróis”. Em outras palavras, o espectador é
levado a crer que as cenas de luta eram perfeitamente possíveis na época em que
se passa a história, porque ela é tão bem retratada que o que era ficção/fantasia
no filme praticamente desfaz-se e torna-o uma mistura entre os genêros épico e
dramático. Essa é a sua grande sacada.
Para isso
grandes personagens são fundamentais. Li Mu Bai é um guerreiro de grande fama,
equilibrado e contido; Shu Lien é também famosa e contida, só que ostenta ainda
uma força e uma segurança tipicamente femininas, que lhe dão uma falsa natureza
de mulher idealizada, ou seja, apenas aparentemente ela é idealizada. Ela
parece, à primeira vista, auto-suficiente, mas como qualquer outra pessoa,
possui carências. Aí justifica-se o fato de que Li Mu Bai e Shu Lien, amigos de
longa data, nutram entre si uma fortíssima paixão bloqueada. São duas pessoas
fantásticas que se amam mas que, simplesmente, enfrentam o problema de que uma
não consegue dizer à outra o que sente. Assim os dois têm (notadamente Shu
Lien) uma falsa aparência de idealização. Já a princesa Jen é, dentre todos os
personagens, a mais densa, favorecida por apresentar a ambigüidade típica da
adolescência: ora ela comporta-se como a classe alta a que pertence deseja,
compromissada com a responsabilidade que envolve os que estão no poder; ora ela
dispara seu lado de guerreira (sim, a princesa Jen é também grande
guerreira, graças a ensinamentos de Raposa Jade, como o espectador verá).
Deseja ela fugir da responsabilidade e do conforto, mas recusa todas as ofertas
que lhe são feitas. De várias maneiras pode ser vista, mas uma frase de Raposa
Jade me parece a que melhor a define: “aos oito anos e já era um poço de
falsidade”. Por fim, Raposa Jade é a grande vilã da história mas é também
alguém que ama outras pessoas, que sofre injustiças e que busca a felicidade.
Claro que
tudo isso não seria possível sem a ajuda de um grande elenco. O trio de
mulheres é o grande destaque nessa área, e dentre elas Michelle Yeoh é a
melhor. Uma injustiça ela não ter ao menos concorrido ao Oscar de melhor atriz.
Assim, as
maiores qualidades do filme estão nas suas cenas de lutas e na complexidade de
seus personagens.
Direção de
arte, fotografia e figurino são mais méritos de “O Tigre e o Dragão”, que
faturou a estatueta nas duas primeiras categorias e recebeu indicação na
terceira. Os efeitos especiais usados são um espetáculo, mas não um espetáculo
à parte, o que no caso aqui é bom, porque naqueles em que os efeitos especiais
são um “show à parte” eles quase sempre parecem pertencer fora ao filme
(e vice-versa), ficando desacoplados, isolados, como se assim fosse: “olhe,
veja, agora teremos uma cena com tal efeito especial! E daqui a pouco outra,
feita só com computação gráfica”. Já o roteiro pode até ser acusado de
desperdiçar boas possibilidades e supervalorizar algumas menores, mas ele é sem
dúvida outro destaque do filme.
Um filme
também oriental, que fez muito menos sucesso que “O Tigre e o Dragão” mas que
podemos considerar como o antecessor deste, é “Entre o Amor e a Glória” (1993),
do diretor Ronny Yu. O grande problema de “Entre o Amor e a Glória” é o fato de
ele ser um épico pouco definido entre comédia, drama e fantasia. Mas
ambos os filmes têm histórias belíssimas e personagens idem. Porém pesa em “O
Tigre e o Dragão” a densidade que Ang Lee impôs em seu filme (e também o
orçamento).
Elenco,
personagens, coreografias, direção de arte e fotografia: esses são os grandes
méritos de “O Tigre e o Dragão”. Claro que não se pode esquecer de seu diretor,
que reuniu os elementos de maneira harmônica e fez um filme denso, bem ao
agrado da Academia.
Assistido
em 26/03/2001, no Cinema Colossal I
Segue abaixo uma cena de luta do filme. Para mim, é uma das melhores da que já vi. São mais de três minutos de tirar o fôlego:
Segue abaixo uma cena de luta do filme. Para mim, é uma das melhores da que já vi. São mais de três minutos de tirar o fôlego:
0 comentários