Filmes que me fizeram (e fazem) chorar
Sabemos que é comum as pessoas
chorarem vendo filmes, assitindo novelas ou lendo livros. É normal; todos temos
sentimentos. Na verdade, acho difícil encontrar alguém que nunca tenha se
emocionado, a ponto de romper em prantos, nessas ocasiões. Só que algumas
pessoas deixam suas emoções aflorarem com mais facilidade que outras. O que depende, claro, dos sentimentos com os quais estejamos lidando.
Muitas pessoas choram também com
notícias que vêem na televisão, em particular, com tragédias e imagens fortes.
São coisas que liberam sentimentos íntimos de cada um, disso posso dizer. Eu,
por exemplo, me lembro de um documentário sobre vida selvagem, que mostrava um carcaju
subindo numa árvore, até alcançar o filhote de águia no topo. O casal de pais
águias tentava, em vão, distrair e assustar o carcaju, voando sobre ele, mas
sem sucesso. E o filhote, meio já crescido, tentava voar e se defender mas não
conseguia, e pude sentir seu desespero e o dos seus pais. Acabou que o carcaju
abocanhou o filhote e o levou consigo. Fiquei chateado, meio deprimido, com
vontade de chorar. Mas assim é a natureza. Talvez o carcaju só matou o filhote porque
tinha, também, suas próprias crias para dar de comer.
Por isso, essa é uma questão muito
complexa, que não tenho como tratar profundamente aqui.
Mas, antes de eu procurar saber
porque filmes fazem as pessoas chorar, procurei investigar porque determinados
filmes me fizeram chorar. Passei do particular para o geral. Comecei de mim, para depois tentar ver pelos outros. É
claro que existem filmes feitos para esse propósito, isto é, levar o espectador
às lágrimas... mas, em regra, só me fazem chorar aqueles dos quais trago coisas
marcantes da minha vida – filmes nos quais a maioria das pessoas não choraria.
Assim, não chorei quando vi “Diário de uma Paixão”, “Titanic” ou “O Paciente Inglês”.
Longe disso. Meu caso é outro. Meus motivos para chorar são outros.
Vamos aos que mais me fizeram
chorar:
1) A Menina e o Porquinho (Charlotte´s
Web). EUA, 1973. De Charles A. Nichols
e Iwao Takamoto.
Toda vez que assisto esse desenho
animado choro. Aliás, desde a primeira vez que o assisti, no SBT, num sábado a
tarde. Eu era bem novinho. O desenho animado se divide em duas partes. Na
primeira, temos o porquinho Wilbur que, desde que nasceu, foi adotado pela
garotinha Fern, filha do dono da fazenda. Ela trata-o com o maior carinho e
amor, dá banho nele, como bichinho de estimação. Entretanto, Wilbur começa a
crescer, e o pai de Fern decide que é hora de ele ir viver com os demais
animais da fazenda até engordar e ser abatido. Ponto.
Fern chora muito a perda do contato
com seu bichinho, na seu quarto. Ela chora, fica triste, e eu junto com ela. O
sentimento de perda é muito grande, dos dois. Entretanto, a menina sempre que
pode vai visitá-lo no chiqueiro, junto aos outros animais, e fica lhe fazendo
companhia e carinho. A menina se resigna, pois no seu íntimo sabe que seu pai
tem razão.
Conversando com outros animais da
fazenda, o porquinho descobre que, quando crescer mais, será morto e vai virar
presunto. Fica apavorado. Sente-se sozinho no mundo, até porque Fern não tem
como visitá-lo sempre. É aí que Wilbur faz amizade com Charlotte, uma aranha
que lhe promete amizade e que fará o possível para evitar que Wilbur seja
morto. Desenvolve-se entre os dois uma amizade enorme. Se antes o porquinho
tinha Fern como mãe, agora tem Charlotte. Uma amizade e um amor existe entre os
dois, como o de uma mãe que tenta, ainda que com recursos limitados, proteger
seu filhote. Através de sua teia Charlotte tece frases sobre Wilbur. Essas
frases tornam Wilbur famoso e fazem com que seu dono desista, de vez, da idéia
de abatê-lo.
Mas Charlotte, como aranha, tem um
vida curta. Depois de salvar Wilbur, ela constrói seu ninho e morre. O porquinho
tem, então, sua segunda perda. Mas logo
uma porção de aranhazinhas brotam do ninho de Charlotte, e voam do
celeiro em busca de uma nova vida. Mas três filhotes ficam lá no celeiro mesmo,
morando junto com Wilbur, e se tornam amigos dele.
Quando assisti “A Menina e o Porquinho”,
pela primeira vez, devia ter uns oito anos. Estava na casa da minha avó
materna. Alguns meses antes, minha mãe
havia falecido. Havia perdido ela, mas até então não havia entendido bem o que
era isso. Sabia que minha mãe havia morrido, mas comecei a sentir sua ausência,
realmente, depois. Wilbur, Fern e Charlotte me ajudaram a compreender o que
aconteceu. Ajudaram-me a lidar com a perda, a me resignar que, infelizmente,
isto ocorre e que Deus tem planos para as pessoas independentemente da nossa
vontade. E que, mesmo quando perdermos alguém, Deus nos aproxima de outra
pessoa: no meu caso, do meu pai. O final do filme é a cena em que mais me
emociono: as filhotezinhas de Charlotte voam felizes para fora do ninho,
levadas pelo vento, dando “tchau” e “adeus” ao porquinho e aos outros animais
da fazenda. Elas eram uma continuação da sua mãe. E eu sou um pedaço eterno da
minha. Passo mais tempo chorando que assistindo “A Menina e o Porquinho”.
1) As Aventuras de Pinóquio (The Adventures
of Pinnocchio) EUA/Reino Unido, 1996. De Steve
Barron. Com Martin Landau.EUA/Reino Unido, 1996. De Steve Barron. Com Martin Landau.
Nesta versão do conto clássico,
Martin Landau faz Geppetto, o velho fabricante de bonecos de madeira que tem um
de seus bonecos transformado magicamente em criança. Ele chama o garotinho de
madeira que, quando mente, cresce o nariz, de Pinóquio. Pinóquio não é uma
criança como qualquer outra, pois é todo de madeira. Mas é muito danado e seu
comportamento não é diferente das demais crianças.
Minha maior identificação com filme reside na relação do pai com o filho. Geppetto já é um senhor com certa idade que se
torna pai – e mãe - de repente. Tal como meu pai, ele tem de educar um garoto sem
mãe (embora, no caso do meu pai, fossem três: eu e meus dois irmãos). Quando
minha mãe faleceu, eu tinha apenas 7 anos, e meus irmãos 9 e 10. Quer dizer,
durante grande parte da nossa criação, meu pai foi “pãe”.
Sinto-me mais emocionado nas cenas
em que pessoas de má indóle tentam separar pai e filho. Certas circunstâncias fazem
com que Geppetto, certa vez, abra mão da criação de Pinóquio, por acreditar que
não é a pessoa mais adequada para tal, mas ele logo se arrepende e se vê
entristecido pela partida do filho. Geppetto, então, reencontra-se com seu
filho e diz que nunca, nunca mais deixará ele partir. Um tem o outro, e um deve
cuidar do outro, apesar de todas as dificuldades da vida. Assim vejo eu e meu
pai.
Assim como pinóquio era um garoto
diferente dos outros, por ser de madeira, eu me via diferente da maioria dos da
escola: afinal, havia perdido minha mãe muito novo.
3) Gonzaga – De Pai para Filho. Brasil, 2012. De Breno Silveira.
O filme de Breno Silveira retrata a
relação de dois grandes nomes da música brasileira: Luiz Gonzaga, Rei do Baião,
e Gonzaguinha, seu filho, que se tornou um dos principais compositores e
intérpretes da MPB. O filme foca nos desentendimentos entre pai e filho.
De novo, emocionei-me muito com
esse filme que, pela natureza da sua história, é emocionante em si. Mas para
mim foi mais forte, pois vários dos pontos da relação difícil entre Luiz
Gonzaga e Gonzaguinha eu vejo na minha relação com meu pai. Gonzaguinha, no fim
das contas, sofria muito por não conseguir se entender com seu pai. Ele perdeu
sua mãe quando tinha dois anos e meio e foi criado principalmente por Dina,
esposa do amigo de seu pai, já que Gonzagão sempre viajava em turnê e quase não
tinha contato com o filho.
Gonzaguinha cresceu no morro do São
Carlos, no Rio, e cresceu um tanto revoltado e marcado muito mais pela ausência
do pai cantor que pela morte precoce da mãe.
Pai e filho se reencontraram depois
que Gonzaguinha já era adulto e fazia sucesso como cantor e compositor. Os
dois passaram anos sem se falar. Antes, quando tentavam conversar, logo a
conversa descambava para brigas e remorsos. Assim tem sido eu com meu pai,
infelizmente. Eu, como Gonzaguinha, quero carinho e aceitação por parte do meu
pai. Mas meu pai, tal como Luiz Gonzaga, é orgulhoso demais para dar-me, ou
melhor, não sabe como fazê-lo. Meu pai e o de Gonzaguinha perguntam-nos até
quando nós jogaremos na cara deles suas falhas, e prosseguem: “Eu te paguei o melhor colégio, não foi? O que você queria mais?”
Em determinada cena, Luiz Gonzaga
diz ao filho: “Você é um moleque! Um moleque!”. Gonzaguinha apenas fica calado,
sem responder, “sangrando” como diz sua música. Meu pai já me chamou algumas
vezes de “vagabundo”, “idiota”, e já me disse “me respeita!”, apontando o dedo
para mim, quando eu digo certas coisas para ele. Mas eu o amo, nem deixaria de amá-lo,
tenho a ele como minha razão de viver. Além do mais, meu pai já está com certa
idade, não quero discutir com ele. Só quero viver coisas boas com ele.
Detalhe: Gonzaguinha não era filho
biológico de Luiz Gonzaga. Assim eu me sinto, em relação a meu pai, às vezes.
Como ou se eu fosse adotado ou, em outras palavras, não pertencesse a ele.
4) Os Gritos do Silêncio (The Killing
Fields). Reino Unido, 1984. De Roland
Joffé. Com Sam Warsterson e Haing S. Ngor.
“Os gritos do Silêncio” foi um
grande sucesso, tendo sido indicado a vários prêmios Oscar, inclusive melhor
filme, melhor diretor e melhor ator. Haing S. Nigor, cambojano, ganhou o prêmio
de melhor ator coadjuvante, interpretando o jornalista Dith Pran. O filme
mostra um grupo de jornalistas ocidentais e seu correspondente no Camboja, Dith
Pran, que acompanham o desenrolar da guerra civil no camboja. Seu desfejo deu
origem ao regime de terror do Khmer Vermelhor, comandado por Pol Pot. Em poucos
anos, 2 milhões de pessoas foram mortas pelo regime – numa população de 10
milhões.
Na segunda parte do filme, Sidney
(Sam Warsterson) e os demais conseguem fugir do país, mas Dith Pran não. Ele passa
então a prisioneiro do Khmer. Numa luta desperada para manter-se vivo,
presencia os campos da morte, os chamados “Killing Fields” do título original.
Pessoas eram forçadas a sair da cidade para trabalhar na agricultura. Quem se
recusava era executado. Milhares foram assassinadas por motivos iníquos, até
mesmo, por serem obedientes demais. Intelectuais, médicos, professores e outras
pessoas com educação superior eram sumariamente executadas. Pran, inclusive,
teve que esconder sua antiga profissão de jornalista para manter-se vivo.
A despeito de todas as
dificuldades, Dith Pran consegue cruzar a fronteira do país, embora sua jornada
tenha lhe deixado fisicamente baleado. Com a música “Imagine”, de John Lennon, tocando
o reencontro entre os amigos Sidney e Pran, não tive como não chorar compartilhando
a alegria dos personagens. Eu chorava e dizia: “ele conseguiu, que bom, não acreditava...
Meu Deus, ele sobreviveu.” E mais: quando Sidney pede desculpas a Pran, por
deixá-lo num país em ruínas, Pran lhe responde: “Não há nada o que perdoar
Sidney, nada”.
Muito já li sobre a guerra no
Camboja e outras guerras. Muitos filmes já assisti, mas foi “Os Gritos do
Silêncio” que me fez chorar. Não só uma lágrima, mas um chororô com direito a
soluços.
5)
O Pequeno Príncipe (The Little Prince). EUA/ Reino Unido, 1974. De Santely Donen. Com Richard Kiley
e Steven Warner.
Assisti ao musical dirigido por
Stanley Donen sem nunca ter lido o livro. Logo me encantei pelo garotinho que
interpreta o Pequeno Príncipe, que veio a Terra em busca de significados para
seus sentimentos. Sua roupa de príncipe, sua ótima interpretação e o carinho que
o restante do elenco dispensa ao contracenar com ele conquistaram meu coração. “Cativaram-me”
o sorriso e a voz do ator do Pequeno Príncipe.
Como não havia lido o livro, não
sabia o final da história. Talvez por conta disso, por desconhecer seu final “triste”,
tenha irrompido em lágrimas. Depois, ao ler o livro, notei algumas coisas que
não havia percebido ao ver o filme. Mas ler o livro não tirou o encanto do
filme de Donen, principalmente pelo jovem protagonista e pelas canções.
6) As Damas de Ferro (Satree Lek). Tailândia, 2000. De Youngyooth Thongkonthun.
Este filme tailandês fez bastante sucesso quando do seu lançamento. Conta a história de um grupo de gays,
travestis e transexuais que, cansados do preconceito, resolvem formar sua
própria equipe de vôlei e disputar o campeonato nacional. O filme é
uma comédia, divertidíssimo. Então você pode se perguntar: por que Mathias foi
chorar num filme desses, que não é triste? Bom, adianto que o time vence o
campeonato tailandês e ganha o direito de representar seu país nos jogos asiáticos.
O que me marcou é que o filme conta
uma história verdadeira. No final, aparecem cenas dos jogadores reais, jogando
e dando entrevistas em programas de televisão. Foi aí que chorei: vendo as
pessoas reais, seus feitos; comparei-os com os atores. Orgulhei-me deles e me
senti feliz por eles. Acho que foi por isso que chorei, de alegria.
E você? Com certeza você também já
se emocionou muito assistindo filmes. Quais foram os filmes que mais mexeram
com você? Eu dividi um pedaço dessa minha experiência com vocês, e adoraria que
vocês contassem um pouco das suas histórias aqui. Devem ser histórias
maravilhosas...
Abração!!!
2 comentários
Mathias, meu querido. A cada dia eu realmente fico mais feliz por conhecer esta pessoa sensível à vida e às artes. Cada momento que compartilho contigo é um aprendizado. Ler teus textos é uma delícia e sempre que o faço acumulo conhecimento e conheço um pouco mais de ti. Bem, ao ler o texto fiquei imaginando você de frente à TV assistindo tais filmes. Fiquei tão concentrado no texto (coisa hiper difícil pra mim) que nem lembrei dos filmes que me fizeram chorar. Apenas no final me veio logo em mente o filme C.R.A.Z.Y. - LOUCOS DE AMOR, que infelizmente tu não gostaste. Fui aos prantos ao longo do filme ao assisti-lo. Em muitas cenas lembrei da minha relação com meus pais quanto á minha sexualidade. Tive momentos muito difíceis com eles, mas no final o amor foi mais forte e prevaleceu. Sempre senti o quanto meus pais me amam e justamente por isso queriam me "endireitar", por assim dizer. Eles achavam que eu seria mais feliz. Mas com o tempo eles perceberam que o que me faria mais feliz era vivermos em harmonia, me respeitando, mesmo sem concordarem. Fora este, não me recordo de nenhum outro que me emocionasse tanto ao ponto da catarse me levar às lágrimas sem que ela fosse levada pelas escolhas do diretor para isso. Caso eu lembre, volto a escrever.
ResponderExcluirÉ incrível como o poder criativo/imaginativo do homem pode nos surpreender, não é? As artes estão aí pra mostrar isso, e com a sétima não poderia ser diferente.
ResponderExcluirQuantas e quantas vezes, num momento qualquer da minha vida, meu melhor amigo foi um bom filme? (tá certo, às vezes nem tão bom rs.)
Há certos momentos que um processo de catarse é tudo o que a gente precisa para aliviar certas tensões. E acho que o filme ainda continua sendo uma forma bem sutil de termos isso. Ele está ali mais perto e fácil.
Enfim, às vezes a gene nem se dá conta de quão medicinal pode ser um simples filme, né?
Parabéns pelo texto & sucesso!