Filmes que marcam a infância (e só a infância)


Todos guardamos como lembrança certos filmes que assistimos quando crianças - mais ou menos na faixa dos cinco aos dez anos - e que, de uma forma ou de outra, nos marcaram. Por experiência própria, creio que boa parte da memória dessa época transforma-se, com o tempo, em imagens estáticas, vinculadas a um contexto fático-psíquico. Enfim, para mim, são essas imagens fixas que deixam as marcas mais fortes, marcas perenes.

Claro que os filmes que marcam a infância de uma pessoa dependerão, em boa parte, da geração a que ela pertence. No meu caso, que nasci em 1980, na maioria das vezes são filmes que passaram na TV de 1985 em diante, mas que são mais antigos. Isso porque, nessa época, os lançamentos chegavam com bastante atraso. Não havia TV a cabo, poucos lares tinham videocassete e internet era palavra inexistente nos dicionários. Esse é o contexto histórico.

Dependerão também de outras coisas, como a educação que você recebeu, meios e recursos audiovisuais a que teve acesso, vida familiar, etc.

Como ficam essas "imagens fixas" daquele filme que você adorava quando era criança, depois que você os revê com olhos de adulto?

Alguns dos filmes que marcaram minha infância: "A Menina e o Porquinho" (1973), "A Invasão das Aranhas Gigantes" (1975), "O Grande Búfalo Branco" e "O Ataque das Formigas Gigantes" (ambos de 1977) e He-man e She-ra em "O Segredo da Espada Mágica" (1985).

"A Menina e o Porquinho", desenho animado da dupla William Hanna e Joseph Barbera, é um caso à parte. Ele é o mais emotivo filme da minha vida. Chorei quando assisti pela primeira vez, criança, e mais ainda quando o revi, na adolescência. E, novamente, quando passei dos 18 anos. Minha relação com ele está no texto "Filmes que me fizeram (e fazem) chorar".

De vez em quando "A Menina e o Porquinho" passava nas tardes de sábado no SBT. Meu irmão chegou a gravá-lo para mim no videocassete.

Recentemente revi dois filmes da lista acima: "O Segredo da Espada Mágica" e "A Invasão das Aranhas Gigantes".

Vi o longa de animação com He-man e She-ra num cinema em Brasília. Adorei o filme; ele logo me marcou e não saiu da minha cabeça. Gostei pelo fato de ser demorado - os desenhos na TV não tinham mais que 15 minutos - e pelo fato de reunir He-man e She-ra. Ficou gravada na memória uma cena em que He-man tem seus poderes sugados por uma máquina e o quanto ele - o homem mais forte do universo - sofre como em nenhum desenho. Além do mais, a ligação dele com She-ra é explicada, já que, na época, já sabíamos que os dois eram irmãos; mas não sabíamos como foram parar em mundos diferentes.

Esse filme também marcou a infância do meu irmão mais velho, e nós o revimos depois de 25 anos.

"O Segredo..." perdeu muito nessa "revisão". Eu o tinha como detentor de uma qualidade técnica impecável. Para os dias de hoje, sua técnica é tosca, com poucos movimentos, perdendo inclusive feio nesse quesito para animações lançadas poucos anos depois, como "A Pequena Sereia" e "Meu Amigo Totoro". Ainda sinto encanto pelo filme, mas estaria mentindo se dissesse que ele é bom. Tem um roteiro bem estruturado, ótimas cores, ótima trilha sonora, mas os diálogos são fracos e as cenas não são bem desenvolvidas.

Tinha um jogo do mega drive, de futebol, chamado "Fifa Soccer 1994". Achava-o perfeito, joguei muito com amigos, era viciado. Pensava, na época, que não haveria como se fazer jogo de futebol melhor, mesmo no futuro: afinal, achava-o perfeito. Enfim, não havia o que mudar, era impossível melhorar o que já era perfeito. Hoje, 20 anos depois, é covardia compará-lo com com "Fifa 2014" ou "Pro Evolution Soccer 2014", ambos no Xbox360 e Playstation3. Esse parênteses com o videogame ajuda a explicar porque "O Segredo..." ficou pra trás na técnica e, principalmente, ajuda na minha idéia de imagem congeladas.

De "A Invasão das Aranhas Gigantes" lembrava poucas cenas: o meteoro que cai numa cidadezinha dos Estados Unidos e gera aranhas gigantes, sendo uma gigantesca e outras do tamanho de uma pessoa; da aranha gigantesca atacando um carro na estrada, suas patas arranhando o vidro do carro, machucando o motorista, e sangue manchando o vidro; dela engolindo uma pessoa; do final, em que um outro meteoro despencava na gigantesca aranha e a matava, da mesma forma que a havia gerado. Eu fique fã do filme, tanto que essas imagens passaram mais de 25 anos congeladas na minha memória.

Bom, assisti-lo novamente hoje de madrugada (18/05/14) e percebi que algumas coisas gravadas na minha cabeça não correspondiam exatamente com a história. Por exemplo, no final, diferentemente do que pensava, não é um meteoro que mata a aranha, e sim explode-se, no local onde ela surgiu e junto dela, uma bomba carregada de nêutrons, com o propósito de destruir o buraco negro que a criou (isso mesmo!).

Percebi também o quanto o filme é ruim e seus efeitos especiais totalmente defeituosos. É ver pra crer e rir.

A  partir daí, decidi não reassistir o filme das formigas e o do búfalo. Deixarei em paz a imagem que tenho deles, vindas da minha longínqua infância. Ficarei com as imagens congeladas, inesquecíveis, que tenho deles e que tanto me agradam. Seria injusto com esses filmes reanalisá-los. Exemplos de cenas deles? Vários: o casal de velhinhos que se refugia das formigas gigantes numa cabana de madeira pensando lá estar a salvo e, quando se dá conta, a casa está totalmente cercada por elas; a moça que foge de uma das formigas, tropeça e cai, mas é salva por um rapaz que, por sua vez, é atacado e morto; o homem que mata uma formiga, mas afunda junto com ela e também morre, perto do fim do filme; o búfalo branco que, em meio à neve das montanhas, carrega em direção a Charles Bronson, que se desvia e atira na fera.

Por certo, nesses dois filmes suas cenas reais não são exatamente como as que descrevi, conforme gravadas na minha mente. Mas foi assim que ficaram grudadas em mim. Mas irei conservá-las comigo, para sempre. Desse modo, terei para sempre, comigo, um pouco da alegria e fascínio que só as crianças têm.


São Luís, 18 de maio de 2014.

Mathias Nelson Faria dos Reis








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1 comentários

  1. Muito bom mesmo conviver com um passado vivificado nas lembranças.
    Em meio a tantas verdades citadas por voçê, Mathias, eis a que me sobressaiu como suprema: A IMPORTÂNCIA DE MANTER VIVA A INEBRIANTE CRIANÇA QUE FOMOS E QUE NOS ACOMPANHA POR TODA VIDA. E acho que seria cabível mencionar neste espaço uma música simples mais transmissível de uma paz e alegria nobrissíma que somente quem apreciou os inumerosos episódeos da TURMA DO CHAVES pode sentir. A letra da música diz assim: "SE VOÇÊ É JOVEM AINDA, AMANHÃ VELHO SERÁ, AO MENOS QUE O CORAÇÃO SUSTENTE, A ALEGRIA QUE NUNCA MORRERÁ". Há uma parte em cada um onde somos nós os responsáveis por construí-la, regá-la e preservá-la, e é nesse pedaço individual que podemos reviver e conservar o nosso melhor desde um adulto responsável à inocente e doce criança sem que o tempo interfira, essa porção é nossa memória, nossas LEMBRANÇAS.

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